Margarida noturna

Margarida noturna

Antes de dizeres sim

Refém sou de ti, enfim

Grande tristeza minha

Hoje acaba:

Estás indo

Respiro fundo

Insisto mudo

Talvez, será…

Amanhã quem sabe?

 

Pasmo com uma besta

Espero com uma besta

Respiro como uma besta

Fujo, tenho medo de ti.

Uma canção não basta para mim.

Misturo cerveja e whisky

Ontem não foi assim.

Maktub maktub

O hoje se desfaz em memórias

Voltarei para casa

Esquecerei o Lago

As ruínas de antes de antes de ontem

Os Imãns e as mesquitas

os  véus, o mistério, o aroma de chá e fumo dos salões escuros

As portas azuis,  o mediterrâneo, as civilizações.

Virá o oceano

O pai e a mãe a esposa

a incerteza e o repouso

o cotidiano de anos atrás

devorando as entranhas aventureiras

e acalmando a alma.

Até quando?

Maktub maktub,  inshallah!

Beduíno

No sol o vazio
Dias longos de imensa angústia
ao meu lado minha fé derretida em areia grossa
sem alma sem casa sem nada
deserto

não há trégua
somente ilusão de felicidade
martírio de uma vida sem luz
apesar do sol
apesar do dia claro
arrastando-se por horas a fio
sem frio
sem brilho
sem nada

mascaradas as tristezas
sem curar as feridas sujas
modorrento verão fétido
vamos seguir a trilha
vamos ser boiada
vamos fingir amor
vamos viver sem cor
vamos
vamos
vamos
e só

Vazio

Entre a terra e a lua

vácuo

entre o véu e os olhos

lágrima

entre a má e a amada

alma

entre a Deus e o cão

entre o meu e o teu

nosso

entre a o som e o surdo

onda

entre a mão e o murro

abuso

entre eu e Eu

o impenetrável e inexplicável vazio que dilacera o pouco que restou

Alvorada desconsolada

Vem o sol passando pela janela

é hora

de ir embora

de deitar-se ao mar

de abandonar

os corações perdidos

passivos

adormecidos

passa pela janela e eu desespero

vem a noite morna

inverno estranho

inferno medonho

das estrelas poucas

das lembranças roucas

das angústias loucas

O azul se derrete em dourado

que se transmuta em piche breu

Quem sou eu?

pergunto ainda

Quem sou eu?

O corpo pede descanso

os ohos pedem repouso

as mãos pedem carícias

peripécias de cama e carne

nos vãos nas frestas na alma

Na noite os uivos e suspiros

meus e desconhecidos

O que tenho de meu?

nunca basta

nunca bastou

e é na noite

morna e escura

crua e dura

que eu pergunto

Quem sou eu?

Quem sou eu que caço em círculo

meus mesmos fantasmas de sempre

se sentam a mesa

tomam chá

pedem torradas Petrópolis

como se estivessem na Colombo

são íntimos

tão meus.

Não pedem licença

invadem minha ceia

me entopem as veias

fantasmas sem dó.

Quem sou eu?

Quem sou eu?

Saberão eles quem sou eu?

Me farto da noite morna

mas não há porta a se abrir

não há como fugir

não há modeo de fingir

até que volte o sol.

O jardim e o vento

O jardim meu
floresceu e fenesceu
morreu
pétalas que o vento leva
sementes que a terra nutre
jardim meu

No Morro da Urca
veja a flor tão bonita
semente que o vento levou
orgulho meu

a liberdade que o vento deu
fez tão bem
achou adubo
cresceu
madurou e virou flor

o cão vai
o cão volta

a areia da praia o vento carrega

a chuva não veio
não sinto seu cheiro
mas lembro seu cheiro

vou sempre lembrar
a vida ensina
ensinam a terra e o ar

na hora de recomeçar
o jardim meu

Cinzeiro

Fura a a fúria e fica

fingindo

fantasia o que é fatal

velha arapuca do sentimento

você já esteve lá

labirinto do cíclico coração maldito

saiu e olhou o céu

respirou, raciocinou, relaxou

mas era ilusão

miragem tola da arrogância

e continua preso

Não há como escapar

As cinzas repousam inertes

não são nada

apenas lembranças amargas de um cigarro ido

consumido pela primeira chama

o tabaco se faz fumaça

e fascina

inebria a seu modo todo seu

traz uma falsa sensação de bem estar

e por fim vira cinza

como a ilusão
Aprecie a dor da desilusão rasgando sua garganta
este dilacerar não permite escolhas

incríveis fragilidades humanas

inocentes fragilidades humanas

há apenas  cinzas de bem-quereres

pousadas ao léu no cinzeiro das vaidades

Pestana

O gênio da lâmpada vem depressa

passa correndo, corrido, pisca, te pisca

sono

passado vem depressa

passa correndo, corrido, pisca, te pisca

hálito quente
boca cerrada

quente respirar

a vida inteira passou
o gênio da lâmpada volta depressa

passa correndo, corrido, pisca, te pisca

tchbum!!

hora de gelo da vida real